“Escrevi
alguma coisa à igreja; mas Diótrefes, que gosta de exercer a primazia entre
eles, não nos dá acolhida. Por isso, se eu for aí, far-lhe-ei lembradas as
obras que ele pratica, proferindo contra nós palavras maliciosas. E, não
satisfeito com estas coisas, nem ele mesmo acolhe os irmãos, como impede os que
querem recebê-los e os expulsa da igreja” (3Jo 2,10).
O
apóstolo João escreveu o Evangelho para que os pecadores pudessem crer que
Jesus é o Cristo, o Filho de Deus (Jo 20.30,31). O mesmo apóstolo escreveu a
sua primeira carta para que os crentes tivessem certeza da vida eterna (1Jo
5.13), sua segunda epístola teve como objetivo alertar sobre o perigo dos
falsos mestres (2Jo 7-11) e nesta terceira carta ele adverte sobre os falsos
líderes. Entre esses falsos líderes estava um homem chamado Diótrefes. Mas quem
era esse homem? O Rev. Hernandes Dias Lopes, citando Simon Kistemaker diz o
seguinte acerca dele:
Sabemos
pouco sobre Diótrefes. Seu nome significa “filho adotivo de Zeus”, o que sugere
que ele seja de descendência grega. Ele é um líder na igreja local e, de modo
egoísta, tira vantagem de sua posição de liderança. Ele gosta de ser o
primeiro. Em vez de servir à igreja, ele se recusa a reconhecer a autoridade
superior. Ele próprio deseja governar a igreja. Ele age de maneira contrária à
instrução de Jesus: “Quem quiser tornar-se grande entre vós, será o que vos
sirva; e quem quiser ser o primeiro entre vós, será vosso servo (Mt 20.26,27)[1].
O
caráter e a conduta de Diótrefes é totalmente contrária a de Gaio. Enquanto
Gaio era um homem obediente, humilde e hospitaleiro, Diótrefes era
desobediente, arrogante e ditador. Ele era um líder soberbo. Ao invés de servir
os outros, desejava que os outros o servissem. Ele não buscava a glória de
Cristo, mas sim honra ao seu próprio nome. Ele buscava não o interesse dos
irmãos, mas os seus próprios interesses egoístas. Ele não amava a igreja de
Deus e nem aos irmãos, ele era um narcisista, amante de si mesmo. O seu ego era
sempre inflado. Ele gostava dos holofotes, era um amante da popularidade. A
força motriz de Diótrefes era o orgulho. Em lugar de dar a preeminência a Jesus
Cristo (Cl 1.18), ele tomava para si. Ele queria ser o centro das atenções.
Ninguém podia ocupar o seu espaço. Ele via a cada pessoa que chegava a igreja
como uma ameaça à sua liderança. Ele havia sido dominado pela ambição e pelo
desejo de domínio. Era um demagogo que ao invés de promover a Cristo, promovia
a si mesmo.
Por
gostar de ser o primeiro em tudo, Diótrefes via o apóstolo João como uma
verdadeira ameaça à sua posição. Ele não desejava aprender com João, mas sim se
livrar dele. João era visto por Diótrefes não como um apóstolo amado a quem
acolher, mas como um rival a quem deveria rejeitar. E por essa razão ele fez
quatro coisas detestáveis:
1. Recusou receber a João (v.9). A hospitalidade era uma prática
recomendada na igreja apostólica: “Praticai a hospitalidade” (Rm 12.13). O
autor aos Hebreus ordena: “Não negligencieis a hospitalidade, pois alguns,
praticando-a, sem o saber acolheram anjos” (Hb 13.2). No século primeiro, os hotéis e as pensões
eram quase que desconhecidos. Muitas pensões antigas ficavam a pequenas
distâncias das casas de má fama. Além disso, as pensões eram notoriamente sujas
e infestadas de pulgas.[2] Novo Testamento as igrejas cristãs reunirem-se nos lares
(cf. Rm 16.2,23; I Co 16.19). Em consequência da perseguição, os cristãos eram
forçados por necessidade a encontrar-se nos lares dos irmãos. Foi assim até os
meados do século III, quando a igreja começou a possuir propriedades para os
propósitos de adoração. Mas antes do século III os cristãos faziam do lar uma assembleia
cristã. Em Laodicéia havia a casa de Ninfa (Cl 4.15), na cidade de Colossos
havia a casa de Filemom (Fm 2). Em Filipos havia a casa de Lídia para onde
Paulo recorria (At 16.15,40) e em Corinto, Gaio é referido como
"hospedeiro... de toda a igreja". (Rm 16.23).
Era uma verdadeira honra hospedar em sua casa os fiéis servos de
Deus. Porém, Diótrefes, movido pelo sentimento de autopromoção, não queria ter
comunhão com um apóstolo do Senhor Jesus, ele desobedecia a essa recomendação
apostólica da hospitalidade e por isso, diz João, “não nos dá acolhida”.
2. Ele mentiu sobre
João (v. 10a). Diótrefes estava
disseminado no seio da igreja mentiras a respeito de João. Ele estava
proferindo palavras maliciosas. Fazendo acusações falsas e infundadas. Talvez
ele tenha feito acusações contra João em alguma reunião da igreja na qual João
não estava presente para se defender. Ele tentou desconstruir a boa imagem do
velho apóstolo perante a igreja mediante calúnias e difamações. Ele cometeu o
pecado mais abominável aos olhos de Deus: espalhar intriga entre os irmãos (Pv
6.16-19).
William Barclay tem razão quando escreve o seguinte:
Ninguém pode fazer uma obra mais cristã do que estabelecer o
relacionamento certo entre os homens. E Deus certamente não considerará
inocente o homem que perturba os relacionamentos pessoais dentro da Igreja. O
pacificador está fazendo a obra de Deus; o provocador de contendas está fazendo
a obra do diabo.[3]
Diótrefes era um mentiroso. Um covarde que falava pelas costas. Mas
João adverte que, em breve, acertaria as contas com Diótrefes. Ele seria
desmascarado. Suas mentiras viriam à tona e a verdade de Deus triunfaria. Nós
precisamos ser cautelosos e filtrarmos aquilo que é dito contra os homens de
Deus, pois muitas vezes, são apenas palavras maliciosas.
3. Rejeitou os
colaboradores de João (v. 10b). Diótrefes odiava tanto a João que se se recusava a receber os seus
colaboradores. Qualquer um que tivesse comunhão com o apóstolo do Senhor era
rechaçado por Diótrefes. Ele rejeitou a João e a todos aqueles que tinham
amizade com ele. Suas palavras são mentirosas e seus atos são reprováveis. Ao
se recusar a receber os missionários que eram enviados para proclamarem o
evangelho de Cristo, Diótrefes se torna um verdadeiro entrave à obra de Cristo,
prestando assim um desserviço ao reino de Deus.
4. Disciplinou os que
discordavam dele (v. 10c). Os membros que resolveram acolher os fiéis servos de Deus foram
expulsos da igreja! Diótrefes age como se fosse o dono da igreja. È um ditador
que intimida e fere aqueles que discordam de suas posições. Ele usou a sua
autoridade para fins diabólicos e doentios. Ele controla, mente, ameaça e
manipula. Ele não age como servo, mas como chefe. Ele pune arbitrariamente os
irmãos que dava acolhida aos colaboradores de João. Ele não tinha autoridade e
nem tampouco base bíblica para expulsar as pessoas da igreja. A sua disciplina
não era bíblica, e sim abusiva, oriunda de um coração endurecido. A disciplina
exercida por Diótrefes é contrária as Escrituras, pois ele expulsava os irmãos
por estes estarem sendo leais a Palavra de Deus. Ele empunha a sua liderança
pela força e coerção. Sua vontade deveria sempre ser obedecida e nunca
questionada. A sua vontade era lei na igreja. Diótrefes encurrala os crentes
com a sua violenta intimidação. Como que dissesse: “Ou vocês me obedecem e
tomam partido contra João, ou ficam com João e sem igreja, porque se ficarem
com ele, ficarão contra mim, e eu tenho o poder de colocar vocês para fora da
igreja”.
Diótrefes fez da igreja uma delegacia, onde ele mesmo era o chefe
de polícia. Ele se tornou uma ameaça à igreja, pois não agia como pastor, senão
como um ditador. Ele julgava e condenava a seu bel prazer. Tratava os irmãos
com dureza e ameaças. Era áspero, ríspido, grosseiro que não tinha amor pelos
irmãos e nem respeito pelo apóstolo de Jesus Cristo.
Infelizmente, há muitos seguidores de Diótrefes hoje em dia. Homens
cegos pelos holofotes. Sedentos por projeção á qualquer custo. Embebecidos pelo
desejo de posse. Pessoas que mentem e difamam a fim de conseguir galgar
posições elevadas no ministério. Pessoas que adoecem a igreja por que não agem
como pastores do rebanho de Deus, mas como chefes que não suportam serem
contrariados. A recomendação do apóstolo Pedro de como deve proceder um
verdadeiro líder é oportuna:
“Pastoreai o rebanho de Deus que há entre vós, não por
constrangimento, mas espontaneamente, como Deus quer; nem por sórdida ganância,
mas de boa vontade; nem como dominadores dos que vos foram confiados, antes,
tornando-vos modelos do rebanho” (1Pe 5.2,3).
Na igreja de Jesus Cristo não existe donos e nem chefes. Não há
espaço na igreja para ditadores, coronéis e papas. Não há espaço na igreja para
aqueles que sofrem da terrível doença chamada: A síndrome de Diótrefes. Aqueles que se colocam no pedestal e
cultuam a si mesmos estão fadados ao fracasso. Na igreja de Cristo, todos
estamos nivelados no mesmo patamar: somos todos servos. Somente Jesus Cristo
tem a preeminência. A igreja não é minha e nem sua, a igreja é de Cristo, pois
foi Ele que a comprou com o Seu próprio sangue (At 20.28).
O amor próprio vicia todas as relações. Diótrefes difamou a João, tratou
com pouco caso os missionários e excomungou os crentes leias porque o seu amor
era a si próprio e ele queria ter a preeminência. A vaidade pessoal ainda está
na raiz da maioria das dissensões em toda igreja local hoje.[4]
Rikison Moura, V. D. M
[1] Hernandes
Dias Lopes, 1,2,3 João, pp. 260,261
[2] John
Stott, I, II e III João, Introdução e Comentário, p. 171
[3] William Barclay, As obras da carne e o fruto do
Espírito, p. 86
[4]
John Stott, I, II e III João, Introdução e Comentário, p.196
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